sábado, 5 de junho de 2010

Dê-me um cigarro



Como um viajante, que sempre retorna nos lugares mais inesquecíveis, assim, sou eu quando escrevo no blog. Sempre lembro com carinho e sei que um dia eu "voltarei". Estou com um texto na minha mente a muito tempo, hoje voltei para
compatilhar.
Dê-me um cigarro
Toda sexta-feira quando volto do trabalho, passo no bar do Pépi peço uma dose de pinga com limão e mel para abrir o apetite, comprimento o Piauí, o Claudião e o Seríguela, que sempre estão lá, talvez até muito antes de eu chegar, e vou para casa. Naquela sexta resolvi ficar e ao invés de pinga resolvi tomar uma cerveja com os meus colegas de bar. Acho que seria interessante conhecer as pessoas do bairro, afinal, já morava nessas redondezas à 2 anos e não conhecia muita gente.
Aqueles homens parecia ser muito inteligentes, só me estranhava o Seríguela, um rapaz quieto, sem muitas palavras, um negro alto e forte com pinta de intelectual e sem muito assunto para compartilhar. As cervejas vinham e a conversa pairava entre fofocas de bar, futebol e novelas. De repente ouvi um berro:
-Pepi, dê-me um cigarro, um de cada marca!
Era um rapaz com mais ou menos 29 à 33 anos, vestia-se de social, uma camiseta amarelada, calça preta e sapatos sem meia. Não era um mendigo, a roupa estava bem passada e limpa. Um rapaz branco, barba bem feita, medindo por volta de 1,80. Mas parecia transtornado.
Pepi gritou do outro lado do balcão:
- Já vou! Pegou um cigarro de cada marca e colocou a mesa onde o rapaz já estava sentado.
- Quem é esse rapaz? Perguntei.
O Seríguela respondeu, com uma voz passiva e bem baixa:
- Seu nome é Fernando, o homem mais triste que conheço, ele mora aqui no bairro desde criança, nunca teve vícios e desde muito novo se dedicou as doutrinas cristã, estudava muito e na adolescência conheceu Raquel. Namoraram por muitos anos, terminaram juntos a faculdade de Comunicação Social e se casaram. Dois anos depois, Raquel engravidou, esperava o primeiro menino Pedro, uma homenagem ao apóstolo.
No oitavo mês, Raquel já sentiu que a bolsa tinha estourado, uma correria total. Fernando resolveu pegar uma carona, estava muito nervoso para dirigir, mas houve um acidente, faleceu a mãe e o bebê.
- Meu Deus que tragédia! E como você sabe de tudo isso Seríguela?
Perguntei.
Ele me olhou nos olhos e seus olhos negros encheram de
lágrimas, como se fizesse o possível para não chorar. E respondeu:
- Eu era o motorista, seu melhor amigo, padrinho do casamento e futuro
padrinho de seu primeiro filho.
Engoli toda saliva que brotava de minhas glândulas.
- Pepi dê-me um cigarro! Pedi.

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