Metamorfose de Narciso, de Salvador Dalí
“Um dia, meu filho, quando você já estiver bem próximo da minha idade, você olhará para essas mesmas lembranças e sentirá falta de tudo relacionado; Porém, e é o mais provável que aconteça, talvez você simplesmente nem as recorde, daí você apenas perceberá que sente falta de algo, sem saber ao certo de quê.”
No feriado mais recente, pela primeira vez eu anos, sentei-me com minha mãe para conversar. Não foi nada programado, até porque, se o fosse, certamente não funcionaria. Mesmo morando juntos todos esses anos, nossas conversas deixaram de ser rotina há pelo menos uma década.
Talvez pelo próprio momento de ambos, foi quase inevitável esse “encontro”. Eu precisava de um “colo” (e minha mãe é ótima pra isso) e ela precisava de dois ouvidos. As palavras brotavam com naturalidade. Mais emotiva do que eu, não demorou muito para ela estar aos prantos. Eu parei de falar. Fiquei ali só olhando para seu rosto já marcado por profundos vincos de sofrimento e auguras. E aqui eu quero abrir um parêntese:
Minha mãe, a primeira de sete filhos, nasceu no interior do Paraná. Perdeu a mãe logo cedo (aos 4 anos) e foi criada pela avó materna. Uma educação rígida: mulher não tinha que estudar; tinha que aprender tudo relacionado ao lar: cozinhar, lavar, passar, cuidar das crianças. O máximo de liberdade que ela conseguiu foram as aulas de costura, isso já com quase 20 anos. Nessa mesma época, surgiu o primeiro pretendente a marido. Ela não o quis. Não queria ficar presa aquela cidade, às lembranças que só lhe faziam mal. Não queria levar uma vida de dona de casa. Tinha o sonho de ser professora. Porém, destino escrito não tem como ser ludibriado. Anos mais tarde, ela conheceu meu pai. Como já estava (segundo a própria) naquela idade crítica onde não choviam tantas opções, resolveu se casar com ele mesmo. E daí já se vão 30 anos como dona de casa. Criando filhos, agüentando desaforos, engolindo revoltas.
Enquanto ela desabafava suas mágoas, eu me perguntava quantas daquelas rugas em seu rosto não eram por minha causa. Quantas noites em claro ou mal dormidas ela não deve ter passado ao meu lado? Quantas vezes foi me defender na escola? E tantas outras coisas que não consigo quantificar agora.. e quando foi que eu lhe agradeci?! Ou, na melhor das hipóteses, tomei conta de sua dedicação?!
Percebi que os meus problemas não passavam de pequenos arranhões perto dos socos e pontapés que a vida já havia lhe dado. Meus olhos ficaram marejados diante de tal sensação. Será que, um dia, serei assim também, frustrado com o rumo que minhas escolhas me levarão?!
Resolvi, a partir daquele momento, parar de transformar meus problemas solucionáveis em obstáculos intransponíveis. Afinal, todos nós temos alguns. É a nossa forma de lidar com cada um deles que nos define.
E eu, nesse ponto, sou um fracassado. Primeiro, porque ainda não aprendi a lidar (satisfatoriamente) com meus problemas, mesmo quando eles se repetem várias e várias vezes. Arrumo fugas e escapatórias mirabolantes (algumas, bem fantasiosas). Tudo porque não tenho coragem de enfrentá-los (os problemas) de frente. Talvez porque fui criado assim: ao menor sinal de perigo, “corra para as colinas!” (rsrs). Segundo, porque tal maneira de não-enfrentamento acaba, muitas vezes, transparecendo aos demais como uma falha, uma arrogância da minha parte. E não o é. Ao menos, não de todo. É apenas o único modo de agir que conheço.
Ou melhor, conhecia! Graças a algumas pessoas (para as quais estou preparando um post-homenagem em breve), estou conseguindo aprimorar minha auto-estima, aprendendo a enxergar e, principalmente, me sentir completo pelas minhas próprias conquistas.
Assim, sinto que estou deixando de ser (apenas) aquele objeto frio e reflexivo, um ‘espelho voltado aos que me rodeiam’, um pedaço de vidro moldado alheiamente. Metamorfico-me, aos poucos, sem pressa, num quadro inacabado. Minha própria obra de arte. Minha vida de óleo em tela.
H (“O que não me mata, me fortalece”, Friedrich Nietzsche)
“Um dia, meu filho, quando você já estiver bem próximo da minha idade, você olhará para essas mesmas lembranças e sentirá falta de tudo relacionado; Porém, e é o mais provável que aconteça, talvez você simplesmente nem as recorde, daí você apenas perceberá que sente falta de algo, sem saber ao certo de quê.”
No feriado mais recente, pela primeira vez eu anos, sentei-me com minha mãe para conversar. Não foi nada programado, até porque, se o fosse, certamente não funcionaria. Mesmo morando juntos todos esses anos, nossas conversas deixaram de ser rotina há pelo menos uma década.
Talvez pelo próprio momento de ambos, foi quase inevitável esse “encontro”. Eu precisava de um “colo” (e minha mãe é ótima pra isso) e ela precisava de dois ouvidos. As palavras brotavam com naturalidade. Mais emotiva do que eu, não demorou muito para ela estar aos prantos. Eu parei de falar. Fiquei ali só olhando para seu rosto já marcado por profundos vincos de sofrimento e auguras. E aqui eu quero abrir um parêntese:
Minha mãe, a primeira de sete filhos, nasceu no interior do Paraná. Perdeu a mãe logo cedo (aos 4 anos) e foi criada pela avó materna. Uma educação rígida: mulher não tinha que estudar; tinha que aprender tudo relacionado ao lar: cozinhar, lavar, passar, cuidar das crianças. O máximo de liberdade que ela conseguiu foram as aulas de costura, isso já com quase 20 anos. Nessa mesma época, surgiu o primeiro pretendente a marido. Ela não o quis. Não queria ficar presa aquela cidade, às lembranças que só lhe faziam mal. Não queria levar uma vida de dona de casa. Tinha o sonho de ser professora. Porém, destino escrito não tem como ser ludibriado. Anos mais tarde, ela conheceu meu pai. Como já estava (segundo a própria) naquela idade crítica onde não choviam tantas opções, resolveu se casar com ele mesmo. E daí já se vão 30 anos como dona de casa. Criando filhos, agüentando desaforos, engolindo revoltas.
Enquanto ela desabafava suas mágoas, eu me perguntava quantas daquelas rugas em seu rosto não eram por minha causa. Quantas noites em claro ou mal dormidas ela não deve ter passado ao meu lado? Quantas vezes foi me defender na escola? E tantas outras coisas que não consigo quantificar agora.. e quando foi que eu lhe agradeci?! Ou, na melhor das hipóteses, tomei conta de sua dedicação?!
Percebi que os meus problemas não passavam de pequenos arranhões perto dos socos e pontapés que a vida já havia lhe dado. Meus olhos ficaram marejados diante de tal sensação. Será que, um dia, serei assim também, frustrado com o rumo que minhas escolhas me levarão?!
Resolvi, a partir daquele momento, parar de transformar meus problemas solucionáveis em obstáculos intransponíveis. Afinal, todos nós temos alguns. É a nossa forma de lidar com cada um deles que nos define.
E eu, nesse ponto, sou um fracassado. Primeiro, porque ainda não aprendi a lidar (satisfatoriamente) com meus problemas, mesmo quando eles se repetem várias e várias vezes. Arrumo fugas e escapatórias mirabolantes (algumas, bem fantasiosas). Tudo porque não tenho coragem de enfrentá-los (os problemas) de frente. Talvez porque fui criado assim: ao menor sinal de perigo, “corra para as colinas!” (rsrs). Segundo, porque tal maneira de não-enfrentamento acaba, muitas vezes, transparecendo aos demais como uma falha, uma arrogância da minha parte. E não o é. Ao menos, não de todo. É apenas o único modo de agir que conheço.
Ou melhor, conhecia! Graças a algumas pessoas (para as quais estou preparando um post-homenagem em breve), estou conseguindo aprimorar minha auto-estima, aprendendo a enxergar e, principalmente, me sentir completo pelas minhas próprias conquistas.
Assim, sinto que estou deixando de ser (apenas) aquele objeto frio e reflexivo, um ‘espelho voltado aos que me rodeiam’, um pedaço de vidro moldado alheiamente. Metamorfico-me, aos poucos, sem pressa, num quadro inacabado. Minha própria obra de arte. Minha vida de óleo em tela.
H (“O que não me mata, me fortalece”, Friedrich Nietzsche)
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