sábado, 20 de dezembro de 2008

Conto de Natal - 1a parte


Pois é, o Natal está aí. E como é de costume nessa época, chove email de felicitação e desejos, com histórias emocionantes e surpreendentes sobre essa data. Como não podia deixar passar, alguns meses atrás, resgatei um "conto de Natal" que o Michel e eu escrevemos para os nossos amigos na época. Postarei ela aqui em duas partes. Já aviso que ela não tem um final feliz. Com certeza, alguns não gostarão de lê-lo até o fim. Bom, mas o que eu posso fazer? Segue a primeira parte:

"Depois de uma última olhada no relógio do microondas, ela ouve o barulho do portão fechando. Ele chegou. Um pouco atrasado, mas chegou. Talvez por causa do trânsito, ou por outro motivo qualquer que no momento não era o mais importante. O importante mesmo era que aquele tinha que ser o instante. Não podia mais esperar para falar a verdade a ele. Ela lembra de estar enrolando a quase três semanas, tentando criar coragem para desabafar, colocar tudo que precisava para fora. A situação já estava insustentável. E era tão simples de se resolver.

Ela estava decidida. Quando escutou a maçaneta da porta da sala girar, seu coração começou a palpitar. Por um breve momento, se sentiu fraca. As pernas ficaram bambas, não o bastante para que desmaiasse, porém o suficiente para ela ter certeza: não seria nada fácil.

A porta se abriu como se estivesse em câmera lenta. Cada milésimo de segundo parecia interminável. Assim que a porta se cerrou por completo, eles se olharam como se a muito tempo não se vissem. Os sorrisos amarelos, tomando-se em conta a situação, foram inevitáveis.

Ele atravessou o corredor que ligava a sala à cozinha com seus passos arrastados de costume. Não parecia desanimado, apenas cansado. Passou por ela, lhe deu um beijo no rosto, perguntando com uma voz de quem não demonstrava tanto interesse em saber a resposta: “Oi, tudo bem?” Isso pesou em seus ombros. Sentiu uma vontade voraz de desabafar. Descarregar até a última letra da sua metralhadora de palavras. Contudo, limitou-se apenas a dizer: “Tudo bem.. e o seu dia, como foi?” Antes que ela terminasse a pergunta, ele já estava no quarto. Respondeu de lá mesmo, aumentando um pouco a voz: “Ah, você sabe.. o mesmo de sempre.. nenhuma novidade”.

Ficaram alguns minutos em silêncio. Logo, ela ouviu o barulho do chuveiro. E pensou: “Ele realmente está mudado. Não é seu costume tomar banho antes de comer!”. Puxou uma cadeira e se sentou. Olhou fixamente para o relógio da parede. Parado. Precisava trocar a pilha. Porém, sua necessidade maior não era essa. Tentou pensar no que falar, revisar os pontos principais, criar uma seqüência em sua cabeça para que nada ficasse de fora. Sem sucesso. Ela sabia que os minutos estavam passando. Pode ouvi-lo abrindo o guarda-roupa.

Transferiu o olhar para suas mãos, espalmadas sobre a mesa. Sentiu-as úmidas. Pela primeira vez, reparou nas rugas que começavam a aparecer. Definitivamente o tempo não estava a seu favor.

Ele passou por ela, indo em direção a sala. Apesar do clima ameno, usava uma regata e uma bermuda. A mesma bermuda que ele havia ganhado no último Natal.

Já estava no final do corredor quando ela, criando muita coragem, chamou: “Querido? Será que você pode vir até aqui? Precisamos conversar” Agora o suor já brotava aos montes na sua nuca. Podia sentir as gotas descendo por sua espinha, gelando-a.

Quando ouviu a frase, ele estancou. Levou alguns segundos para girar nos calcanhares e fazer o caminho de volta. Apesar de conseguir ver o seu rosto, reparou que ele tinha o olhar fixo no chão, como se já soubesse qual era o assunto que ela queria discutir. Essa idéia lhe deixou ainda mais preocupada. Arrependida, na verdade. Queria não precisar dizer aquilo que ia dizer, mas não podia mais. Lembrou das noites mal dormidas, remoendo essa história que necessitava de um fim. Logo.

- Sente-se aqui, ao meu lado.
- Mas o que aconteceu? É alguma coisa grave? – já foi ele perguntando num tom defensivo, demonstrando que gostaria de estar em qualquer outro lugar, menos ali, tendo aquela conversa.
- Antes de começar, quero te perguntar: você tem alguma coisa que queira me dizer? – disse ela, olhando-o de soslaio.
- Eu? Eu.. não.. nada. – respondeu gaguejando. E completou, cabisbaixo – eu, nada.
- Tem certeza, Carlos Eduardo? Não tem nada que esteja te afligindo?

Carlos Eduardo. Ela só o chamava assim quando o assunto era de muita gravidade. Raríssimas vezes ouviu seu nome inteiro sair da boca dela. Ainda mais com tantas perguntas embutidas. Ele apenas sacudiu a cabeça, num movimento de negação.

Ela precisava agir. Viu-se encurralada. Imaginou que, com um diálogo, talvez conseguiria transmitir tudo que era preciso. Seria tudo mais fácil, se ele cooperasse. Porém, parece que teria de ser na base do monólogo mesmo. Esperou mais alguns segundos para ver se ele diria algo. Nada. Continuou cabisbaixo, sem nenhum espasmo muscular que fosse. Ela sentiu seus olhos marejarem."

To be continued...


H (Ho.. ho.. ho)

Nenhum comentário: